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Ex-assessores de Passos falam ao dcmais e citam ameaça, assédio e ‘rachadinha’; defesa nega

Foto:v Arquivo DC

* Por Felipe Liedmann

O Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) abriu nesta quinta-feira (7) uma sindicância interna para apurar possíveis crimes cometidos pelo vereador Felipe Passos. A iniciativa partiu após o ex-chefe de gabinete confeccionar boletim de ocorrência relatando caso de ameaça por parte do parlamentar. Em documento enviado ao presidente da Câmara, Daniel Milla (PSD), o partido também cita assédio sexual e peculato, a popular ‘rachadinha’.

O caso veio à tona a partir de uma publicação do colunista político Marc Sousa, do ‘Ricmais’, e confirmado pelo DC, que teve acessos a documentos. O episódio surge poucos meses após Passos e a cúpula do PSDB no município terem conflitos.

O que há de concreto até o momento é o ‘BO’ confeccionado no dia 22 de dezembro de 2020, na Polícia Civil de Ponta Grossa, pelo ex-chefe de gabinete de Passos, Felipe Reis, e duas atas públicas notariais registradas em cartório no dia 28 de dezembro de 2020. Uma delas tem como declarante o próprio ex-chefe de gabinete e a outra um ex-assessor que pediu para não ser identificado na reportagem.

Os três documentos deram início ao processo do PSDB após a virada do ano. Segundo o ex-chefe de Gabinete, o objetivo inicial dos registros não era levar Passos à justiça. “A minha intenção, quando fiz a ata no cartório, era só deixar registrado para caso acontecesse alguma coisa comigo e indicar que poderia ter vindo da parte dele [Passos]. Eu não ia jogar na mídia, não ia entrar com ação na Câmara e nem nada disso. Foi o pessoal do partido dele que viu a ata e resolveu tomar providências”, comenta.

O temor corrobora o conteúdo do boletim de ocorrência confeccionado 6 dias antes. Nele consta: “relata o noticiante que foi ameaçado pelo então vereador Felipe Passos, o qual depois de uma discussão por assédio sofrido pela vítima por parte do vereador, que o vereador disse à vítima: ‘tenho um conhecido que já matou um, para matar outro não custa’ (sic); diante disso registrou boletim nesta delegacia”.

Boletim de Ocorrência por ameaça foi registrado no dia 22 de dezembro

O conteúdo não deixa claro o tipo de assédio, mas o ex-chefe de gabinete diz ao DC que enfrentou casos de assédio moral e sexual dentro da Câmara e que partiram de Passos. Boa parte do conteúdo está em mensagens de WhatsApp. Os ‘prints’ estão anexados às atas no cartório.

Um terceiro ex-assessor que não se identificou à reportagem confirma que no final do ano passado houve uma reunião entre assessores e que as mensagens de assédio foram expostas à equipe durante o encontro. Ele informa que todo o grupo deixou o trabalho de assessoria “por esse e outros motivos” e afirma que “o clima lá estava bem complicado”.

O grupo pretende ingressar no Ministério Público “com mais provas e novas denúncias”.

“Há algum tempo estamos procurando ajuda, conversamos com autoridades e amigos. Todos eles aconselhando a manter a cabeça fria e orientando se tinha provas do que estava falando. Muitas autoridades falaram para deixar passar a eleição. Trabalhei na campanha sim, ajudei, mas sempre achando que ele poderia melhorar e mudar. Mas chegou um ponto em que ficou insuportável. Segurei até onde deu. Tenho provas de que ele não ia me exonerar, mas eu não preciso disso para continuar trabalhando”, expõe o ex-chefe de gabinete.

Assédio

De acordo com os ‘prints’ que estão anexados a uma das atas notariais, o ex-funcionário seria importunado sexualmente por Felipe Passos. Supostamente o parlamentar mandava mensagens dizendo ‘amar’ o ex-chefe de gabinete e o chamando de ‘Amor’, ‘Lindo’ e outros adjetivos similares.

“Eu me esquivava, ficava quieto, não retrucava e nem respondia, pois sempre que eu falava para ele parar começava a achar defeitos para querer mandar embora”, conta o ex-chefe de gabinete.

Em nota oficial, o vereador Felipe Passos afirma que vem “sendo ameaçado e sofrendo extorsão de pessoas de má índole infiltradas na política”. O parlamentar acrescenta nas redes sociais que, “de forma covarde, jogaram mensagens deturpadas e fora de contexto na mídia. A verdade virá à tona. A justiça será feita”, finaliza.

Contudo, segundo o ex-chefe de gabinete, os episódios também ocorreram pessoalmente na Câmara. “Ele puxava meu braço quando a gente estava em reunião e queria me agarrar. Eu saía da sala e os outros assessores viam que eu saía transtornado. Não tem como ele negar isso”, expõe.

Segundo o ex-funcionário, casos de assédio moral no trabalho também foram registrados nesse período. Um dos mais graves, de acordo com ele, envolve a pandemia.

“O ponto mais crítico que eu perdi a cabeça na campanha foi quando praticamente toda a nossa equipe pegou covid e ele [Felipe Passos] queria obrigar o pessoal com covid a ir para a rua pedir voto. Cheguei a brigar com ele por causa disso. Ele falava que era conveniência. Todas eu tenho prova”, diz.

A reportagem do DC entrou em contato via telefone com o vereador para esclarecer os apontamentos dos ex-assessores. Felipe Passos solicitou que os contatos sejam intermediados pelo advogado Fernando Madureira.

Segundo a defesa, o ‘tucano’ nega qualquer envolvimento em episódio de assédio a assessores.

Advogado Fernando Madureira é o responsável pela defesa de Passos. Foto: Arquivo DC

‘Rachadinha’

O PSDB cita em documento repassado à Câmara Municipal de Ponta Grossa que as atas notariais apresentam “fortes indícios” de crimes como peculato, “comumente conhecido como ‘rachadinha'”. Ela consiste no repasse, por parte de um servidor público ou prestador de serviços da administração, de parte de sua remuneração a políticos e assessores.

Em mensagens que constam nas atas notariais registradas pelos ex-funcionários, o contato de Felipe Passos pede dinheiro aos então funcionários do gabinete. Na troca de mensagens há fotos anexadas de comprovantes de depósitos dos assessores para o parlamentar. Eles teriam sido realizados em diferentes meses de 2020.

“Eu entrei no serviço e ele começou a dizer que tinha que ajudar porque precisava pagar contas, precisava fazer coisas dele, por a vida dele em dia porque estava endividado. Estava devendo nos cartões e passava de R$ 20 mil as dívidas. Em uma das ocasiões ajudei e comprei o computador dele. Paguei à vista. Depois ele veio pedindo mais dinheiro. Tínhamos que ajudar ele para poder estar de novo no ano que vem [2021]. Só ia dar cargos para quem ajudasse ele nesse sentido”, diz um dos ex-assessores ao DC.

Ele conta que fazia pagamento de combustível e de lavagem de carro do vereador; em algumas ocasiões o parlamentar, segundo o ex-assessor, teria solicitado R$ 3 mil. “O meu salário com desconto dava R$ 3.400. Eu tinha minhas contas. Tenho família”.

Um terceiro ex-funcionário diz ao DC que Passos fazia pedidos indiretos e que essas solicitações seriam como forma de doação para a campanha “mas eu pelo menos nunca doei”, relata.

De acordo com o advogado Fernando Madureira, Felipe Passos nega qualquer repartimento salarial com assessores. A defesa esclarece que aguarda uma intimação oficial para apresentar explicações.

“Vamos ter que aguardar uma intimação oficial da Câmara ou da Polícia para apresentar nossa versão dos fatos. Por ora, estamos aguardando”, explica Madureira. O único ato oficial de momento é a apresentação do PSDB à Câmara de Ponta Grossa sobre a abertura de sindicância interna.

Passos x PSDB

O episódio acontece menos de três meses após Felipe Passos deixar a Executiva do PSDB em Ponta Grossa. A decisão partiu do Diretório Estadual, que nomeou uma Executiva Provisória depois que vários membros da antiga coordenação municipal deixaram o cargo. O atual presidente, que substituiu Passos, é o ex-prefeito de Ponta Grossa, Marcelo Rangel.

Passos e o PSDB tiveram atritos no período pré-eleitoral em 2020. O vereador chegou a ser pré-candidato a prefeito. Poucos dias depois, o partido optou por apoiar a candidatura de Elizabeth Schmidt, do PSD. Felipe Passos então era visto como nome certo para vice da professora.

No final de agosto, sem acordo entre as partes, o parlamentar usou as redes sociais para declinar do Executivo e anunciar que tentaria a reeleição para vereador. Na campanha, o apoio dele não foi dado à Elizabeth. O alinhamento estava com Márcio Pauliki (SD).

No dia 15 de novembro, Passos conseguiu 2.546 votos e renovou o mandato por quatro anos.

Comissão de Ética

No documento encaminhado ao presidente da Câmara Municipal, a Executiva Provisória do PSDB Ponta Grossa informa que o material acusatório “será encaminhado para o diretório nacional e estadual a fim de que o então filiado, Felipe Ramon dos Passos, seja julgado perante o Conselho de Ética” do partido.

Ofício do PSDB de Ponta Grossa afirma que abrirá sindicância interna

O DC entrou em contato com o diretório nacional do PSDB. Via assessoria, a Comissão de Ética Nacional informou que ainda não recebeu representação contra o vereador de Ponta Grossa e destacou: “os diretórios e comissões municipais têm a competência estatutária para decidir sobre filiados com mandato de vereador”.

Câmara

O presidente da Câmara, Daniel Milla (PSD), confirma que o ofício da Executiva Provisória do PSDB de Ponta Grossa chegou à Casa. Mas o período de recesso não permite um avanço interno da questão, pois depende de diversos fatores.

“Ainda não recebi por inteiro a questão da denúncia em relação ao Felipe Passos porque a Câmara está em recesso. Essa é uma questão mais legislativa, precisa de Corregedoria para analisar primeiramente e, caso a Corregedoria entenda que os fatos ocorreram, precisa de uma Comissão Processante. Então não foi montado nada e não tenho como dar um parecer técnico sem ao menos ter a leitura dos fatos”, diz Milla.

Perfil

Felipe Ramon dos Passos ficou reconhecido em Ponta Grossa aos 23 anos, quando se organizou com amigos para arrecadar dinheiro e ir à Jornada Mundial da Juventude. No dia 13 de janeiro de 2013, bandidos invadiram a casa de Felipe e, na tentativa de assalto, ele acabou baleado no pescoço. Entrou em coma e perdeu o movimento das pernas.

Meses depois, Felipe Passos deu um testemunho na Jornada Mundial da Juventude ao lado do Papa Francisco e em frente a cerca de 4 milhões de pessoas na praia de Copacabana.

Entrou na vida política em 2016, quando foi o segundo vereador mais votado de Ponta Grossa. Atualmente, além de parlamentar do Legislativo Municipal, ele ocupa a suplência de deputado federal pelo PSDB. Em 2018 recebeu 49.661 votos de paranaenses para o cargo.

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