Apenas nos últimos sete anos Ponta Grossa recebeu 35 grandes investimentos industriais, referentes tanto à vinda de novas empresas, quanto à ampliação de plantas já instaladas. Juntos, eles somam R$ 2,82 bilhões e geram aproximadamente 16.610 novos empregos, entre 3.322 diretos e 13.288 indiretos, estimados. De acordo com os dados mais recentes do Ministério da Economia, até 2018 a cidade contava com 808 estabelecimentos industriais.
Mas como esses números influenciam as famílias ponta-grossenses? Para responder essa pergunta, a reportagem do Diário dos Campos buscou abordar dois diferentes pontos: o econômico e o social, sob diversas perspectivas.
Além de avaliar o quanto a industrialização impactou e representa na economia da cidade, também buscamos retratar a empregabilidade, a partir do perfil geral dos ocupantes dos novos postos de trabalho, exemplificado com uma história real, e também como as indústrias influenciam a vida do cidadão que não tem o seu salário pago por nenhuma delas.
Produção industrial é revertida em infraestrutura pública
O índice mais icônico de uma economia é o Produto Interno Bruto (PIB), que soma todas as riquezas produzidas por um determinado local. Como o PIB municipal divulgado é sempre referente a dois anos anteriores, uma forma alternativa de acompanhar a evolução mais recente é pelo Valor Adicionado (VA), que é, basicamente, o PIB das empresas que são tributadas pelo ICMS.
Nos últimos cinco anos o VA de Ponta Grossa cresceu 30,67% nominalmente (sem o desconto da inflação): com um incremento de R$ 2,26 bilhões, ultrapassou a marca de R$ 9,63 bilhões no ano passado.
A indústria, um dos quatro setores que compõem o valor adicionado, cresceu 32,4% no mesmo período, somando mais de R$ 5,76 bilhões. O seu aumento foi de R$ 1,41 bilhão, o que representa mais da metade (62,4%) da alta total das quatro atividades econômicas (agricultura, indústria, comércio e serviços).
Os dados são da Secretaria Estadual da Fazenda e apontam que a indústria representa quase 60% de tudo que é produzido na cidade – cerca de R$ 3 a cada R$ 5.
Comparada a outras cidades do Estado, Ponta Grossa tem a quinta indústria mais forte e também a quinta maior economia paranaense. De 2018 para 2019 o maior município dos Campos Gerais ultrapassou Londrina e Foz Iguaçu no ranking do valor adicionado e já se aproxima de Maringá, que ocupa a quarta colocação, com apenas R$ 100 milhões de diferença – montante que era seis vezes maior há dois anos.
Impactos públicos
Parte desse dinheiro reflete diretamente na população – e não apenas naquelas pessoas que têm os seus salários pagos pelas indústrias locais. Os impostos pagos pelas empresas são direcionados ao governo. Quanto maior a produção, maior o montante tributado.
No ano passado, 25,17% do total arrecadado foi destinado à educação e 26,62% à saúde – além dos hospitais, unidades de saúde e escolas, segurança e outros serviços públicos são custeados com esses valores.
O industrial Álvaro Scheffer, um dos representantes locais da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), também destaca o impacto da industrialização na infraestrutura da cidade – como as empresas precisam de sistemas consolidados de distribuição de água, energia e gás, por exemplo, investimentos dessas áreas sempre são amplificados nas cidades que têm este perfil produtivo.
De cada 5 ponta-grossenses, um trabalha na indústria
De acordo com os últimos dados divulgados pelo Ministério da Economia, Ponta Grossa empregou 87.895 pessoas com carteira assinada em 2018. Apenas o setor industrial tinha contratadas 16.791 pessoas – o equivalente a praticamente um a cada cinco dos trabalhadores da cidade. Porém, pensando na cadeia gerada pela fabricação de produtos, além dos que atuam diretamente na produção e gerenciamento das fábricas, há também aqueles que prestam serviços a elas, como limpeza, segurança, transporte e comercialização dos produtos fabricados.
Considerando este fator, o cálculo é que a cada emprego direto gerado na indústria, cerca de outros quatro sejam fomentados indiretamente. Para Álvaro Scheffer, a estimativa é de que uma vaga industrial gera duas no comércio e duas na prestação de serviços.
Em entrevistas concedidas separadamente ao DC, tanto ele, quanto o secretário municipal de Indústria, Comércio e Qualificação Profissional, José Loureiro, destacaram que o perfil dos empregos industriais também é diferenciado. “Geralmente são pagos salários maiores do que em outros segmentos, além de benefícios como seguros e planos de saúde, por exemplo. Isso significa uma renda maior para ser gasta no nosso comércio, pois um setor puxa o outro”, ressalta o gestor público.
Oportunidades únicas
Como o trabalho industrial geralmente é bem especializado a qualificação da mão de obra é muito valorizada pelo setor. Em muitos casos as próprias empresas acabam investindo na formação dos seus colaboradores e proporcionando oportunidades que talvez não aconteceriam em outras situações – impactando não apenas economicamente, mas também socialmente.
Um exemplo disso é a trajetória de Juliano Araújo, funcionário da Tetra Pak de Ponta Grossa. O hoje supervisor de produção começou a trabalhar na indústria em 1999, quando a empresa começou a operar na cidade, e desde então acumula cerca de dez promoções, quatro viagens executivas internacionais, um diploma universitário e o conhecimento de mais um idioma – entre as conquistas do carro e casa própria.
“Eu comecei a trabalhar com 15 anos, como aprendiz em uma metalúrgica quando fazia curso de mecânica geral no Senai. Em 1999 passei no vestibular do CEFET [atual UTFPR], mas ao mesmo tempo fui aprovado no processo seletivo para atuar na Tetra Pak. Meu sonho era trabalhar em uma empresa grande e aos 20 anos, já casado, optei pelo emprego ao invés da graduação”, contou ele à reportagem do DC.
Junto com o desenvolvimento da fábrica, Juliano também desenvolveu a sua carreira acumulando elevações de cargos sucessivas. Há nove anos ele deu o seu primeiro passo para sair da área técnica e ir para a de gestão: começou a cursar Administração e, por isso, conseguiu mais uma vez trocar de vaga dentro da indústria. Um ano depois começou a estudar inglês – para o qual, assim como a graduação, teve auxílio financeiro da Tetra Pak, que subsidiou os seus estudos.
Em 2014 fez a sua primeira viagem internacional: um treinamento no México para conhecer um novo equipamento que até então só existia naquele país. Sua segunda viagem, também ao México, foi em 2017, com motivo inverso: ele foi ajudar a desenvolver analistas mexicanos, levando a forma de trabalho da unidade ponta-grossenses. Dali um ano, foi enviado à Suécia e à Itália.
“Sou apaixonado pelo que faço. A Tetra Pak acredita que a base de tudo são as pessoas e sabem que a sua melhor ferramenta é o conhecimento delas, porque máquina tem em todo lugar”, disse Juliano, hoje com 40 anos.
Ele é casado e possui quatro filhos; uma das três filhas já trabalhou na Tetra Pak como aprendiz e o caçula sonha em fazer engenharia para atuar na empresa. “Sou criado e nascido em Ponta Grossa e é um orgulho muito grande falar da Tetra Pak, uma multinacional, e da nossa cidade”, finalizou ele.
Investimentos sociais
Desde 2018, quando a Associação dos Amigos do Hospital da Criança iniciou as suas atividades, R$ 5,12 milhões foram arrecadados por meio de doações de empresas e pessoas físicas. O recurso foi revertido em investimentos no hoje chamado Hospital Universitário Materno Infantil. O maior financiador desse período foi o Ministério Público Federal de Ponta Grossa (R$ 2,25 milhões) e o segundo uma indústria: a DAF Caminhões, que segundo a associação, soma R$ 1,5 milhão em doações.
Segundo a empresa, a sua última grande doação foi para o hospital, na abertura da sala de tomografia e revitalização de 22 leitos. A montadora também cita como outras ações desenvolvidas ao decorrer do tempo a compra de móveis para instituições sociais, parceria com a UTFPR para desenvolvimento de respirador mecânico a partir do motor do limpador de para-brisa de caminhões, além de apresentações filantrópicas do seu coral, entre outras atividades.
“Nosso objetivo é contribuir, no curto, médio e longo prazo, para o desenvolvimento da cidade através da geração de empregos e também na melhoria da qualidade de vida das pessoas, não somente das pessoas que trabalham conosco, mas de toda a comunidade. Programa de voluntariado, doações, parcerias com escolas e universidade são algumas das maneiras que encontramos”, afirma Jeanette Jacinto, Diretora de Recursos Humanos da DAF Caminhões Brasil.
14 indústrias estão com negociações avançadas, segundo Prefeitura
Uma das funções da Secretaria Municipal de Indústria, Comércio e Qualificação Profissional é negociar e fomentar a instalação de novas empresas em Ponta Grossa. De acordo com o gestor da pasta, José Loureiro, pelo menos 14 novas empresas já estão “engatadas”. “Se não fosse a pandemia elas já estariam se instalando na cidade. Entre elas temos uma moveleira gaúcha, uma de garrafas e uma petroquímica, que recicla óleo”, exemplifica ele.
Nas últimas semanas a cidade também teve a confirmação de um investimento milionário da Tatra Trucks, montadora tcheca de caminhões. “Esse grupo soma 21 empresas e, segundo a embaixadora do país deles, quando a Tatra estiver em operação outras devem se instalar por aqui também”, afirmou Loureiro.
Perfil
Em quantidade de estabelecimentos, de acordo com dados da Fiep referentes a 2018, os principais ramos industriais de Ponta Grossa são o metalmecânico, fabricação de móveis e fabricação de alimentos – isso sem contar o da construção civil.
“É importante termos essa diversificação porque é mais seguro: se uma atividade entra em crise a cidade não ‘quebra’”, avalia Loureiro, que também destaca as cervejarias locais: “Segundo o presidente da Heineken, a ampliação que eles estão fazendo, somada à presença da Ambev, tornarão Ponta Grossa a capital mundial da cerveja porque será a maior produção da bebida em uma só cidade”.
Álvaro Scheffer citou, além desses setores, também a força da agroindústria e do setor madeireiro nos Campos Gerais. “Mas a principal vocação de Ponta Grossa é a sua localização, importante para as empresas que têm apelo logístico”, opina o industrial.