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“Sou pessimista quanto à vida inteligente nos debates eleitorais”

Economista lamenta que debate político não deve abordar temas essenciais para progresso e critica baixa qualidade de argumentos no ambiente político

 

Divulgação

Pio Martins: “Os políticos no poder não precisam aprender a ciência de produzir com eficiência, submeter-se à competição e correr o risco de falir”

 

A tendência é que pelos próximos meses e até as eleições do ano que vem, o debate político esteja predominado por temas que pouco sejam relacionados ao desenvolvimento econômico e social e deem mais peso para assuntos que sejam de agrado e fácil assimilação ao eleitorado. “Sou pessimista quanto à possibilidade de haver vida inteligente nos debates eleitorais”, afirma José Pio Martins, economista e reitor da Universidade Positivo (UP).

A falta de propostas mais substanciosas no debate eleitoral, na opinião de Pio Martins, se deve tanto às opções definidas por marqueteiros, ou mesmo ao baixo nível intelectual de boa parte dos políticos. A má qualidade da argumentação dos políticos, inclusive, também é criticada pelo economista. “O problema é quando o debate inteligente desaparece completamente do parlamento”, critica o professor.

Em entrevista ao Dário dos Campos, José Pio Martins também lamenta a presença e o fortalecimento de discursos nacionalistas e populistas no ambiente político. Confira trechos da entrevista:

Diário dos Campos – O Sr. comenta que o tema de privatizações é ‘abominado’ por aqui. Por esse entendimento, este deve ser um tema caro a políticos, sobretudo em época de campanhas eleitorais. Acredita que é possível alguma liderança política (ou partido) defender estes argumentos na campanha presidencial em 2018?

José Pio Martins – A idolatria da estatização no Brasil decorre de uma deformação cultural (a crença de que o Estado pode tudo), da falta de conhecimento das funções do Estado, da ausência de instrução formal em Economia e de desinformação sobre os males que a estatização provocou ao redor do mundo. Sou pessimista quanto à possibilidade de haver vida inteligente nos debates eleitorais, seja pelo baixo nível intelectual dos candidatos, seja porque são os marqueteiros que escolhem as teses que os candidatos vão defender. A função da campanha é conseguir votos e não pregar coisas racionais. Logo, os candidatos falam aquilo que dá votos, não o que é o mais adequado para o progresso da nação.

DC – O Sr. já criticou o nacionalismo e o populismo, que costumam ter muitos adeptos no Brasil. No artigo “A Glória da Burrice” chega a afirmar que “o nacionalismo protecionista condena o país ao isolamento e ao atraso. Mas os nacionalistas – de direita (inclusive alguns militares) e de esquerda – reivindicavam medalhas de defensores da pátria”. Como o Sr. vê a possibilidade de discursos nacionalistas e também populistas ganharem mais força nas eleições do ano que vem?

J.P.M – O nacionalismo que prega o fechamento do país ao exterior é uma doença infantil completamente estúpida. O que mais o Brasil precisa, se quiser sair do atraso em que se encontra, é abrir-se para o mundo e para a inserção internacional. E por quê? No mínimo, porque esse é o único caminho para o país conseguir atrair a gigantesca revolução tecnológica e as invenções que o mundo produziu e continuará produzindo. Um exemplo simples: se as teses nacionalistas não tivessem sido golpeadas nos anos 90, os brasileiros continuariam morrendo pela simples falta de um equipamento de tomografia. Ou alguém acredita que, se o Brasil não tivesse importado as inovações nos equipamentos médicos, algum brasileiro teria inventado um tomógrafo computadorizado? Quanto ao populismo, a melhor definição é que ele propõe soluções simples para problemas complexos. A promessa mais populista dos candidatos é o elenco de coisas que eles dizem que vão dar ao povo. O povo precisa ser instrumentado para produzir seu próprio sustento, e não viver eternamente da esmola estatal, que, aliás, é paga pelo dinheiro tomado do próprio povo.

DC – O Sr. também já criticou em seus artigos a má qualidade do debate no Congresso Nacional, ao qual se referiu, no artigo “Lições da Pobreza dos Outros”, como um “valhacouto de mediocridades intelectuais e parlamentares desaparelhados para a discussão inteligente dos grandes temas nacionais”. Há alguma chance, em sua opinião, da Câmara Federal e Senado apresentarem alguma melhora neste debate nos próximos anos?

J.P.M – Roberto Campos dizia que uma parte da sociedade é composta de idiotas, e seria uma injustiça se os idiotas não estivessem representados. É normal que uma parte do Congresso Nacional e das Assembleias nos Estados seja composta de idiotas ou de bondosos sem cultura. Não se espera coisa diferente disso, sobretudo porque a democracia não é um sistema para eleição dos melhores, mas um sistema para eleições dos mais numerosos, ou seja, dos que têm mais votos. O problema é quando o debate inteligente desaparece completamente do parlamento, como se houvesse total ausência de vida inteligência na casa. E como o sucesso na política depende mais da capacidade de conquistar votos do que o nível de conhecimento e cultura, não há muito o que fazer.

DC – O Sr. afirmou no artigo “O encolhimento do capitalismo”, que “gastar o dinheiro dos outros, sem imposição de racionalidade e competência, é o esporte preferido dos políticos e da burocracia estatal”. Em sua opinião, porque não há esta preocupação com os gastos públicos por parte da maioria dos políticos brasileiros? E qual seria a alternativa para a mudança deste conceito?

J.P.M – A questão é simples: os políticos no poder não precisam aprender a ciência de produzir com eficiência, submeter-se à competição e correr o risco de falir. Suas receitas são obtidas por confisco do dinheiro dos outros, via impostos. Logo, a única preocupação deles é gastar. E gastam muito mais do que arrecadam. Como os gastos não são avaliados nem julgados segundo sua racionalidade e eficiência econômica, o que mais se vê é ineficiência, desperdício e corrupção. Um país com baixo nível médio de educação, nível de conhecimento pequeno e mais nível cultural acaba produzindo esse tipo de situação sem que a população se dê conta de que o problema está onde realmente ele está.

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