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Passarinhos passarão, mas nem tudo passará!

Luis Carlos Santos

Foram poucas as horas que pude desfrutar da carismática companhia que – mesmo após várias décadas! – pela sua intensidade humana, se fez indelével e de mérito que justificam esta homenagem ao saudoso Nelson.

A voz do nosso pequeno gigante, após enlevar com sentimentos elevados em dezenas de milhões de discos em vários idiomas, silenciou neste primeiro domingo de 2014. Em maiores lamentos, com certeza, lastimam os que tiveram o privilegio de seu convívio, pelos palcos da vida…

Nosso conhecimento deu-se num eventual baile-show, quando tínhamos pouco mais de vinte anos e muitos sonhos entre os pesadelos políticos e sociais da ditadura militar. A propósito, o refrão de Tudo Passará revela sutilmente uma mensagem de otimismo ao futuro do país.

Nosso baile-show, programado num pequeno clube social de Telêmaco Borba, teve a condução da banda ponta-grossense Os Vibrantes – da qual atuei como crooner – com o acompanhamento na apresentação do pequeno-gigante que despontava no cenário nacional, ainda… Lembro, sem falsa modéstia, que as bandas de maior realce no show business do interior paranaense eram Os Dragões e os Jetsons, também ponta-grossenses.

O espetáculo inesquecível e mais sublime aconteceu após nosso baile show e antes do retorno a nossas estradas pessoais, num humilde restaurante de caminhoneiros, quando fomos em busca da Ceia dos Notívagos, ou seja, as sobras das refeições do dia…

Saboreávamos um lanche improvisado, naquele ambiente rústico e singelo, quando fomos interrompidos pela tímida interpelação da dona do restaurante que, ao reconhecer o Nelson, aproximou-se e emudecida de emoção o abraçou em lágrimas!

A comovente cena de puros sentimentos transbordando paralisou a todos, num profundo e respeitoso silêncio… Transformamo-nos, então, de casual plateia em órfãos suplicando colo!

Inesperadamente, neste momento único e inusitado, fluiu do centro daquele abraço o canto-capela mais sublime que já ouvi, entoando Ave Maria de Bach! Das sussurradas notas graves e os altos decibéis dos agudos orquestrados na voz do nosso grande Nelson, nenhum dos corações presentes saiu ileso! Foi, simplesmente, celestial!

Ainda, confirmando sua iluminada missão em forma de arte e coroando em gloriosa apoteose esse clima etéreo, o brilho do nosso astro surpreendeu-nos ao fundir o clássico universal com nosso Carinhoso, do Pixinguinha! Como magia, desde o verso …e os meus olhos ficam sorrindo, foram se somando vozes comovidas de garçons, cozinheiras, caminhoneiros e os raros clientes da madrugada num deslumbrante coral de almas em uníssono! Valeu, mesmo, grande Nelsinho!

Nosso retorno, de Telêmaco Borba à Ponta Grossa, oportunizou diálogos sobre amenidades dos bastidores artísticos e o conturbado governo da época. Divagávamos, assim, atentos e ariscos com um olho no gato e outro no peixe e muito otimismo e fé em Deus!

A única contrariedade, em compreensível tolerância, foi do nosso empresário-artístico Clomir Tito – não fumante… – ao charuto que, pela dificuldade em segurá-lo entre seus pequenos dedos, o Nelson empunhava na palma da mão. A irreverente e oportuna encenação, como se pode imaginar, com O Espadachim da Espada Fumegante foi muito cômico e hilário!

Na encruzilhada dos nossos caminhos – já em Ponta Grossa, numa lanchonete na Praça Barão de Guaraúna – relembro da sua lição em revigoramento, ao tomar café amargo com Coca Cola. Essa era, então, sua fórmula química estimulante/energizante e o que mais nos alienava e entorpecia era injetada pelo sistema dominante da ditadura militar…

Nesta inquietante e inspirada geração, Nelson Ned era um garoto que, como eu, idealizava com paz e amor universal – além do Vietnã e Woodstock – sob os olhares nos palcos das Jovens Guardas do mundo.

Neste clima das emoções, num cenário de velada guerra-fria, o estopim da explosão mundial do sucesso do nosso pequeno-gigante foi aceso e o ascendeu em chama de calor humano como mensageiro perene do bem maior!

Nosso gigantinho Nelson Ned nos legou, comprovando a incontestável reflexão filosófica, o exemplo real de que a estatura humana deve ser considerada pela dimensão e direção de atitudes e que – conforme atesta em seu hit parade – …só se encontra a felicidade, quando se entrega o coração!

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