Por maioria de votos, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça decidiu restabelecer a decisão liminar que proibiu o Instituto Água e Terra (IAT) do Paraná de continuar regularizando imóveis rurais consolidados em áreas de preservação permanente (APPs) e de reserva legal de Mata Atlântica.
O IAT é a autarquia ambiental parananese. A proibição foi feita liminarmente em primeiro grau e mantida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público do Paraná.
A proibição levou o IAT a acionar o STJ, com pedido de suspensão de liminar e sentença. Em junho de 2021, o então presidente da corte, ministro Humberto Martins, suspendeu a decisão por identificar risco de lesão à economia pública.
Nesta segunda-feira (12/8), a Corte Especial decidiu mudar essa posição. Prevaleceu o voto divergente do ministro Herman Benjamin, que afastou qualquer risco no restabelecimento da proibição imposta na origem, enquanto dura a ação.
Seguiram a divergência e formaram a maioria os ministros Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell, Benedito Gonçalves, Antonio Carlos Ferreira, Villas Bôas Cueva, Joel Paciornik, Francisco Falcão e Nancy Andrighi.
Ficou vencido Humberto Martins, seguido pelos ministros Raul Araújo, Isabel Gallotti e João Otávio de Noronha.
Boiada passando
A regularização promovida no Paraná se insere no contexto do Despacho 4.410/2020, do Ministério do Meio Ambiente, que no governo de Jair Bolsonaro (PL) recomendou a aplicação do Código Florestal em áreas de Mata Atlântica.
Os artigos 61-A e 61-B do código, já julgados constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, permitem continuar atividade rural, de ecoturismo ou turismo rural em áreas consolidadas até 2008, mesmo que sejam de preservação permanente (APP).
Já o artigo 5º da Lei da Mata Atlântica diz que a vegetação primária ou secundária, em qualquer estágio de regeneração, não perde essa classificação, mesmo em caso de qualquer tipo de intervenção não autorizada ou não licenciada.
Portanto, valem as limitações impostas pela lei, mesmo quando a área já estiver consolidada — o que, em teoria, seria alcançável pelas normas do Código Florestal.
O despacho foi motivo de judicialização e acabou revogado pelo então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, mas acabou reverberado no Paraná, onde a autarquia ambiental entendeu que cabia aplicar o Código Florestal em áreas de Mata Atlântica.
Perigo reverso
Quando suspendeu a liminar que proibiu a regularização de áreas consolidadas em terreno de Mata Atlântica, o ministro Humberto Martins apontou que o Código Florestal de 2012 foi objeto de ampla discussão legislativa na busca do equilíbrio entre a preservação ambiental e o crescimento econômico.
Para ele, ficou demonstrado o impacto econômico da decisão do TRF-4 no agronegócio, na geração de empregos, na arrecadação de impostos, no cálculo do índice de participação dos municípios e na concessão de crédito agrícola.
No voto vencedor, o ministro Herman Benjamin sustentou que o risco da demora é inverso: deixar que o estado do Paraná aplique uma anistia a todas as sanções administrativas impostas a quem construiu em área de Mata Atlântica, permitindo a prescrição.
“É que, se nós não deliberarmos neste momento no sentido de afastar a suspensão, quando isso for decidido no mérito, estará tudo prescrito. Estamos falando de milhares de infrações administrativas praticadas”, apontou o magistrado.
A suspensão de liminar é uma medida excepcional que não tem natureza jurídica de recurso. O STJ, portanto, não decide se cabe a aplicação do Código Florestal em área de Mata Atlântica, apenas avalia o risco da liminar concedida pelo TRF-4.