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Ponta Grossa: uma cidade marcada pelas ferrovias

No final de uma estrada de terra, no bairro Cará-Cará, imediatamente nos fundos do aeroporto Sant’Ana, em Ponta Grossa, está um imóvel abandonado. O telhado deu lugar à copa das árvores que cresceram desde o assoalho. As paredes perdem parte da estrutura a cada nova chuva ou vento forte, mas algumas letras ainda restam, para atestar que ali funcionou uma estação de trem.

O progresso da cidade, entre o final do século 19 e início do século 20, esteve diretamente relacionado às ferrovias que a cruzavam. Mas o trânsito dos automóveis e caminhões foi se tornando cada vez mais intenso e, nos anos 1980, muitas das linhas férreas começaram a ser retiradas. Provavelmente tenha sido inevitável. Alguém imagina, hoje, os carros parando na avenida Vicente Machado, à espera da passagem de um trem de carga?

Mas, mesmo com essa mudança estrutural, Ponta Grossa ainda guarda resquícios desse passado importante. Marcas no espaço urbano que procuram manter a memória viva. Às vezes, isso é possível com um olhar, em outra ocasiões, é preciso conversar com alguém como José Francisco Pavelec.

Aos 70 anos, Pavelec é um entusiasta do passado e do presente das ferrovias. Isso vem de berço, literalmente. “Nasci em Rebouças, mas boa parte de minha infância foi em Fernandes Pinheiro. A casa ficava à beira da linha e, do berço, eu enxergava o trem. Além disso, tinha vários parentes ferroviários”, recorda. Ele próprio trabalhou, ainda que por pouco tempo, nas ferrovias. Mas guarda muitas recordações das viagens que fez, algumas delas com duração de seis a oito horas. O tempo era contado em outra velocidade.

Morador de Ponta Grossa, Pavelec destaca algumas das estruturas que ainda resistem, mesmo que sem manutenção, como símbolos de uma época nas qual os viajantes não sonhavam com trajetos percorridos a 110 Km/h, nem com a pressa relacionada a diálogos instantâneos de whatsapp ou refeições a base de comida congelada.

 

Passarela no Centro

Muita gente não sabe, mas a passarela que conduz pedestres da rua Catão Monclaro até a rua Fernandes Pinheiro não foi construída para levar ao shopping Popular, conhecido como Paraguaizinho. Também não foi feita para passar sobre a avenida Bispo Dom Geraldo Pellanda. Muito antes de ser avenida, por ali passavam os trilhos do trem. E a passarela em questão era a ligação principal de quem chegava de trem à Estação Saudade e precisava se deslocar até o hospital 26 de Outubro (hoje atrás do shopping Palladium). Na região também havia um grande mercado de secos e molhados, onde os ferroviários podiam fazer compras com desconto na folha de pagamento. Hoje há faixas de pedestre e semáforos, mas a passarela continua ali. Muitas pessoas caminharam sobre ela, tendo a sensação única de ver o trem passar sob seus pés.

Passarela foi criada para permitir travessia segura sobre trilhos (C?edito: Fábio Matavelli)
Retrato de trabalhadores nas ferrovias sob a passarela (Reprodução Facebook)

 

Parque Linear

Nos últimos dois anos, a prefeitura vem realizando uma série de intervenções no chamado parque Linear. O nome tem duplo significado: além de ser disposto em linha reta, ele segue o caminho antes percorrido pela linha do trem. Parte da estrutura de uma antiga plataforma ainda resiste, no trecho denominado praça dos Ferroviários. Quem costuma percorrer a pista de caminhada, pode olhar para o lado e ver os trilhos. Pavelec lembra que, daquele ponto, muitas pessoas aproveitavam para fazer uso gratuito do trem. “O trem, que vinha de União da Vitória, parava por pouco tempo no bairro Oficinas e seguia em direção ao Centro. O trajeto era curto e não dava tempo de cobrar esses novos passageiros, que acabavam sendo transportados de graça”, diz.

Linha férrea ainda pode ser vista sob vegetação no parque Linear (Crédito: Fábio Matavelli)

 

Estação Cará-Cará

A estação Cará Cará é descrita no site Estações Ferroviárias do Brasil, de autoria de Ralph Mennucci Giesbrecht. Segundo o portal, o local foi aberto para uso em 1948 e pertencia à Rede Viação Paraná – Santa Catarina (RVPSC). No final dos anos 1960 passou a ter uso por passageiros. A partir de 1980 foi ponto de saída para as oficinas e desativada em 1989. Segundo a empresa Rumo, que administra a malha ferroviária na região, o imóvel não está na lista de bens arrendados da concessionária, tendo sido repassada ao Dnit. A prefeitura de Ponta Grossa informou que, com a ampliação prevista para o aeroporto, haverá adequações no entorno, mas não há previsão de retirada dos trilhos ou demolição da estrutura em ruínas da estação.

O velho e o novo: estação convive com passagem dos aviões (Crédito: Fábio Matavelli)

 

Museu ferroviário

A restauração da Estação Saudade deve ser concluída neste mês, se tornando uma unidade cultural do Sesc. Haverá no local uma sala-museu destinada à história das ferrovias na região. Para isso, estão sendo recebidas doações de objetos, fotos, documentos e notícias para compor o espaço. Quem tiver interesse em fazer doação pode entrar em contato com o Sesc pelo telefone (42) 3309-2850.

 

Saiba mais

O Diário dos Campos possui uma página no Facebook que tem a proposta de ser um espaço para compartilhar fotos e informações sobre a história de Ponta Grossa. Acesse o link do “Ponta Grossa Memória Viva”, que já tem mais de 1,3 mil membros.

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