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Está sobrando dinheiro para o produtor rural?

Luiz Rodrigues*

 

 

 

A agricultura tomou de vez o rumo da sustentabilidade. Um dos programas mais importantes da política agrícola brasileira é o ABC, que direciona crédito a taxas módicas para que o agricultor adote sistemas que mitigam o aquecimento global. Ao mesmo tempo difunde técnicas para promover plantio direto, integração lavoura-pecuária-floresta, recuperação de pastos degradados. Tudo integrado. Só tem um problema: dos R$ 3,15 bilhões disponibilizados na última safra, menos de 500 milhões foram utilizados. Se a taxa é atrativa (cerca de 5,5% ao ano) porque os negócios não deslancham?

Já foi dito que as técnicas não seriam interessantes, não trariam rentabilidade ao produtor, só serviriam aos propósitos ambientais. Todavia o programa foi concebido com a participação de especialistas da Embrapa utilizando somente sistemas de alta produtividade, boa rentabilidade e que já estivessem sendo adotados com sucesso.

Plantio direto é consagrado, o que o programa busca é expandi-lo. Tratamento de resíduos animais traz retorno garantido. Mesmo a integração lavoura-pecuária-floresta, que é mais complexa, traz excelentes resultados, como mostra a Fazenda Santa Brígida, de Ipameri, em Goiás. O problema não está nas técnicas requeridas.

Outro ponto levantado é a burocracia envolvida. Sejamos sinceros: este é um programa que dá boas condições com uma contrapartida: técnicas sustentáveis. Ninguém quer pegar dinheiro no banco para ter um uso específico. Quer usar para aquilo que bem entender. Mas a sociedade só concorda em pagar um preço por aquilo que tem valor, e os juros baixos exigem contrapartida. Entretanto é fato que em algumas regiões o legado histórico de nosso sistema de terras impede que os produtores tenham titularidade de suas posses, o que emperra o crédito.

O programa Terra Legal tem avançado neste ponto, mas ainda não cobre todos os casos. Sobre os demais documentos exigidos, o sistema bancário pode ter um papel mais pró-ativo em auxiliar seus clientes. 

O cerne da questão está mesmo é na capacidade de oferecer projetos. Relembro que nos idos do ajuste fiscal profundo, em 1999, um deputado me alertou em um simpósio na universidade: jovem, quando acabarem os ajustes, virão as grandes obras de infraestrutura. São necessárias. Mas não se iluda: teremos problemas.

Depois de tantos anos parados perdemos a capacidade de fazer projetos. Aqui parece a mesma coisa. O programa ABC visa levar a agricultura a um novo patamar tecnológico, mas os engenheiros agrônomos que elaboram os projetos desconhecem, na maioria das vezes, tais técnicas. Perderam a capacidade de pensar técnicas, de buscar a inovação, viraram meros despachantes de financiamento. É fundamental recuperar essa função tão importante de projetar e de dar assistência técnica.

O diagnóstico está dado. Os técnicos que implementam o programa já têm clareza do problema. Estão trabalhando para resolvê-lo. Há um calendário repleto de treinamentos e capacitações.

Por ora está sobrando dinheiro, mas se os ajustes no programa continuarem seguindo nesse bom caminho, corre-se outro risco: faltar recursos para a quantidade de projetos que serão oferecidos num futuro próximo. Esse risco, todavia, é muito melhor para a sociedade que quer um ambiente mais equilibrado. Nesse caso vai ser melhor faltar do que sobrar.

 

 

 

O autor é engenheiro agrônomo e especialista em Políticas Públicas.

http://perfildaagricultura.blogspot.com/

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