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Como é que é? Casamento gay? (II)

Laércio Lopes de Araujo

Hoje nos revoltamos contra a escravidão, mas nas escrituras há escravos. Como não compreendemos a realidade da homossexualidade, tratamos o fenômeno como algo diferente, temos de dissecá-lo, despi-lo de sua natureza absolutamente humana e comum. Para a ciência trata-se de orientação sexual, condenamos que seja uma opção, porque não consideramos que as pessoas possam ser responsáveis por seus desejos. A história das relações homossexuais é tão antiga quanto a humanidade, e muitas vezes não significou depreciação do humano, basta lembrar Safo de Lesbos, Alexandre o Grande, Ricardo Coração de Leão, e tantos outros que marcaram a história. Esta condição apenas existe, e isto basta.

O direito de se casar é um sonho dos homens e mulheres que amam um ser humano do mesmo sexo, constitui isso um marco de aceitação pela sociedade? Obviamente não. A aceitação dos homossexuais não passa pela aceitação do Casamento Gay. Antes o casamento é uma conquista de uma sociedade que quer se libertar de tutelas que a infantilizam. Curioso observar que os homossexuais lutaram tanto para conseguir o direito de casar, quando os heterossexuais estão cada vez menos preocupados com ele. Aqueles que se colocam como adversários do casamento gay dizem que autorizá-lo ameaça a instituição casamento e que assim, enfraqueceríamos os valores de família. Por que amanhã não permitiremos a poligamia (e já não somos em muitos casos uma sociedade poligâmica)? Por que duas pessoas? E por que não três? Não nos é possível medir os efeitos positivos e negativos do reconhecimento do casamento homossexual. O que acontecerá com a família? Com o casamento? Ele continuará existindo como uma instituição presente na sociedade, como sempre existiu, apenas diferente.

Outro problema é a adoção. A Holanda é o único país a dar pleno direito de adoção. O que faz supor que os gays não possam educar crianças sem afetar o desenvolvimento delas? Nada. Pais de sexo diferente não são, nem de longe, garantia de boa educação. O que garante uma boa educação é muito amor, dedicação e o objetivo de construir um ser humano digno, livre de qualquer preconceito, e útil a sociedade. A psiquiatra Carmita Abdo, do Hospital das Clínicas de São Paulo, que coordenou o projeto “Sexualidade”, esclarece: “Quando subvertemos o papel da mulher e ela deixou de cuidar dos filhos em casa para trabalhar muita coisa mudou. Estamos piores? É questão de opinião. Creio que tivemos perdas e ganhos. Mas prever essas alterações antes de elas acontecerem é praticamente impossível.” Quando a mulher precisou sair para trabalhar, o seu papel de provedora do lar se confundiu com o papel masculino e isso não arruinou o casamento e muitas vezes garantiu uma melhor educação para as crianças, recuperando um papel estereotipado sobre a condição feminina.

Especialistas analisaram pesquisas disponíveis sobre o tema para o Journal of Divorce and Remarriage (“Jornal do Divórcio e Recasamento”) onde afirmaram que todas tinham falhas metodológicas, impedindo uma análise criteriosa da existência de qualquer influência sobre a criação infantil. Tal análise levou à conclusão óbvia de que os pesquisadores dos dois lados estavam engajados numa causa e terminaram por constatar: “Não precisamos apenas saber se existem diferenças. Temos uma decisão moral a tomar: a sociedade teria o direito de prevenir a criação de indivíduos que eventualmente seriam mais abertos a comportamentos e relacionamentos homossexuais?”.

Devemos nos preocupar se tivéssemos mais gays no mundo? Tolerar a diferença é uma arte, que deve ser exercitada com muita sabedoria e dedicação todos os dias! Ou alguém aí, que é casado com uma pessoa do sexo oposto, não tem que fazer todos os dias, um exercício enorme de tolerância, de dedicação, apenas para dizer, sem nenhuma reserva… Eu te amo!

Encontramos na profundidade da alma do outro, vista a partir da janela entreaberta pelos olhos, a inesgotável possibilidade de ser feliz, e ser feliz pressupõe não considerar absolutamente nenhum defeito, nenhuma qualidade, apenas e tão somente, amar. Se é por um homem ou por uma mulher, não faz diferença. A diferença está no amor que se dá, sem condição. Como é que é, Casamento Gay? Não, senhores! Apenas Casamento.

O autor é médico, membro da Associação Brasileira de Psiquiatria, Mestre em Filosofia pela UFPR, formando em Direito e palestrante 

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