em

Trilha sonora da cidade em transformação

Rafael Schoenherr*

Uma das revelações do rock paranaense de 2011 veio do teatro. Mais exatamente, da sala B do Cine Teatro Ópera, no centro de Ponta Grossa. Foi o lançamento do simpático EP independente ‘Não’, cartão de visitas da banda The Wonderboys. O CD possui seis músicas autorais (download em http://www.myspace.com/thewonderboyss), interpretadas com entusiasmo por Luimar, Doug e Luam num show que se destacou pela qualidade da produção, visível na preocupação com os detalhes.
Esse talvez seja um motivo razoável para que o pequeno e atento público daquela noite de agosto insira com orgulho essa modesta e valiosa iniciativa juvenil entre as recordações afetivas do ano passado. Prova de que os balanços da área cultural perdem muito se levam em conta somente estatísticas e resultados consolidados. É preciso olhar para aquilo que sinaliza ou começa a desenhar um futuro da cena musical. Ainda que seja um lugar menos seguro do que nossas saudosas recordações.
Havia algo mais nos aplausos da plateia. Mistura de orgulho (a melhor face de nosso bairrismo), diversão e surpresa, como se o momento inaugurasse uma fase ainda desconhecida e sem nome do rock na cidade.  O show começou com a leitura no palco de um texto poético de apresentação sobre a banda. Logo os meninos sobem, as luzes começam a trabalhar e surgem as composições, com pouco intervalo entre elas. Em minutos está dado o recado para o qual não parecemos estar preparados. Uma sutil ruptura com a camisa de força que já representou o termo ‘banda cover local’ por duas décadas. Não pertenço a ninguém, reza o refrão. Só obedeço minha mãe, completa Luimar.
São duas tentativas interessantes de superação, o que não quer dizer que eles reneguem PG ou jamais toquem músicas de outros artistas, mas já carregam apostas na manga. Os meninos possuem relação umbilical com Oficinas e o Bando da Leitura, uma das melhores iniciativas de articulação via mecanismos federais, como os Pontos de Leitura. Eles aprenderam a lição e gravaram gratuitamente o EP ‘Não’ na Casa Brasil, projeto cultural do Governo Federal que funcionava no Jardim Paraíso.
Semanas antes do lançamento, os Wonderboys tocavam no Bola 13, espremidos no antigo palco atrás da porta. O repertório era recheado de canções do rock brasileiro anos 80. Mas se insinuava ali um certo clima pueril que não se aprende, ao contrário da técnica – a ser aprimorada. Era uma banda distante daquela do tempo do Rock Delirius, numa esquina da Rua Paula Xavier, tentando copiar Los Hermanos. Agora, felizmente, estão acima disso.
Vivemos em uma cidade que cresce e não sabe ao certo no que vai se transformar. E talvez a música dos Wonderboys seja a trilha confessional no subsolo do teatro de quem vê surgiu o primeiro posto de gasolina em um bairro ou de quem contempla as árvores do tempo de infância todas cortadas para dar lugar a novas moradias. Mas já conseguimos nos sentir ligeiramente mais velhos. Retiraram os trilhos. Está aberta a nova geração do rock daqui. Vento bom em dias de calor baforento.

* jornalista e membro do Conselho Municipal de Cultura de Ponta Grossa.

Participe do grupo e receba as principais notícias da sua região na palma da sua mão.

Entre no grupo Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.