Dirceu Cardoso Gonçalves*
O tétrico acidente da Avenida Paulista, em que o carro arrancou o braço do ciclista (e o motorista, alcoolizado, fugiu e jogou o membro num riacho), tem ocupado boa parte do noticiário dos últimos dias. O relato voltou a ser notícia por causa da libertação do jovem, beneficiado por um habeas corpus, depois de passar 11 dias na prisão. Divide espaço com a notícia da jovem de 25 anos que se feriu ao cortar a frente de um ônibus, com sua bicicleta, na Avenida Rebouças. Esses e outros fatos envolvendo ciclistas 52 deles morreram em acidentes durante o ano passado nas ruas de São Paulo levaram o prefeito Fernando Haddad a interessar-se pelo problema. Reunido com cicloativistas, ele ouviu reivindicações e prometeu verbas para construção de ciclovias e ciclofaixas, além de um plano de comunicação para promover a segurança de ciclistas.
A bicicleta é um antigo e interessante meio de locomoção. Mas, para poder conviver com os outros entes do trânsito urbano, precisa estar inserida num contexto em que seu condutor reconheça e obedeça às regras para, com isso, poder exercitar seus direitos e deveres. Não basta alguém que viajou à Ásia ou Europa e lá viu ciclistas trafegando em meio aos carros vir aqui, pintar faixas ou colocar cones nas ruas e dizer que aquilo é uma ciclovia. É necessário que tanto ciclistas quanto motoristas sejam conscientizados de que a rua é um espaço público e que nela terão de conviver, respeitando-se mutuamente. Há que se definir áreas para o ciclismo de transporte e o esportivo e, também, que utilizar todos os recursos técnicos e de comunicação para evitar acidentes.
Tanto na capital paulista quanto em outras capitais e cidades brasileiras grandes e médias é comum encontrarmos pelas ruas o ciclista inconsciente, que trafega sobre as calçadas, passa no sinal vermelho, circula na contramão e ainda diz que faz isso porque, no contrafluxo, vê melhor os veículos pois estes vêm em sua direção. Também é frequente o motorista chegar a um cruzamento, olhar para o lado de onde vem o trânsito e, ao avançar, ter a sua frente atravessada por um ciclista vindo da contramão. É preciso dizer a esses usuários da carinhosa magrela que, num acidente, os mais vulneráveis são eles.
Não podemos ignorar que, desde a implantação da indústria automobilística, o sonho de todas as pessoas é ter um carro. Durante as últimas cinco décadas, as cidades brasileiras foram pensadas exclusivamente para o veiculo automotor. As bicicletas, que tanto serviram aos nossos avós, foram alijadas do processo e só utilizadas na periferia, por gente muito pobre. Exceção àqueles que as têm para o esporte e o lazer. Agora, para reintroduzí-las como opção de transporte, é preciso uma ampla e cuidadosa operação. O grande ponto de interrogação, sem qualquer dúvida, está na educação do ciclista, do motorista e, até, do pedestre. Sem isso, nada feito…
*Dirigente da Associação de Assistência Social dos Policiais Militares de São Paulo (Aspomil)