O enredo do desaparecimento de Marlene Acácio, ocorrido em 17 de dezembro do ano passado em Ponta Grossa, ganhou um capítulo que provocou uma reviravolta nesta quinta-feira (25). Após mais de dois meses de investigação, a Polícia Civil prendeu no bairro Jardim Carvalho um casal suspeito de envolvimento no sumiço. Contudo, os policiais descobriram que a empresária desaparecida não é apenas vítima da situação. Marlene também estaria envolvida em um roubo que ocorreu no mesmo dia em que foi vista pela última vez.
Ela teria arquitetado o crime dias antes em conjunto com o casal com o qual foi filmada na tarde de 17 de dezembro, uma quinta-feira. A mulher presa preventivamente é ex-funcionária da empresária e o homem é o marido da ex-funcionária. Os dois, supostamente, foram as últimas pessoas a terem contato com Marlene.
O trio almejava um cofre que pertencia a um parente em afinidade da empresária. O objeto, aparentemente, de tempos em tempos passava para a guarda de outra pessoa, em novo endereço. Antes de estar em posse das vítimas do roubo, era guardado justamente por Marlene.
“Isso gerou uma suspeita”, afirmou o delegado responsável pelas investigações, Fernando Jasinski. No planejamento do crime, a empresária atuou, segundo a Polícia Civil, repassando informações privilegiadas aos supostos comparsas, pois tinha proximidade com a vítima que mantinha a guarda do cofre.
No fatídico dia do desaparecimento e do roubo, a polícia constatou, inclusive, que Marlene esteve na residência do casal de suspeitos no Jardim Carvalho. Naquele dia, ela teria tomado o café da manhã com o casal e, possivelmente, mandou uma mensagem para a vítima do roubo perguntando se ela estava na residência na hora do almoço. Poucas horas depois, ocorreu o assalto e o cofre foi levado.
O roubo ocorreu em Uvaranas, por volta das 11h30, executado por dois homens encapuzados. Eles invadiram a casa, renderam os dois moradores, chamaram um deles pelo nome e pediram pelo cofre. O objeto foi levado logo em seguida. Suspeita-se que um dos ladrões é o marido da ex-funcionária. O segundo participante ainda não foi identificado. Apesar do assalto, as vítimas não fizeram boletim de ocorrência.
Segundo o delegado Jasinski, a ex-funcionária não participou diretamente da ação, mas sabia de todo o plano. Ela e Marlene, de acordo com as investigações, eram bem próximas e mantinham conversas frequentemente. Os contatos entre as duas na época do crime foram intensos.
Cerca de quatro horas após o roubo, por volta das 16h, Marlene deixou o próprio carro estacionado no Centro e entrou no veículo no qual estavam os dois suspeitos e o filho do casal: uma criança de um ano de idade. Uma câmera de segurança registrou o momento. Essa foi a última imagem de Marlene desde o dia 17 de dezembro.
A Polícia Civil apurou que dali eles seguiram para uma região erma no Distrito de Uvaia, zona rural de Ponta Grossa. A descoberta foi possível depois que um produtor rural localizou pertences de Marlene jogados no meio de um milharal. “Ele encontrou a bolsa com os documentos da Marlene”, relata Jasinski. Esse fato aconteceu no dia 10 de fevereiro. Diante da circunstância, a polícia conseguiu pedir o mandado de prisão do casal, cumprido no início da manhã desta quinta.
Os dois devem permanecer por tempo indeterminado na Cadeia Pública Hildebrando de Souza. Na próxima semana, ambos devem ser ouvidos por Jasinski, responsável pela condução do caso que diariamente consumia de 30% a 40% do seu tempo, conforme ele mesmo estimou.
Segundo a polícia, a prisão dos dois suspeitos é um importante passo para a investigação, que agora segue para a conclusão. O casal está sendo investigado pela prática do roubo agravado e também poderá responder pela prática de homicídio e ocultação de cadáver.
Marlene está viva ou morta?
As investigações seguem com o intento de localizar Marlene, que nunca mais foi vista e está incomunicável desde o dia do desaparecimento.
Os policiais querem saber o que exatamente ocorreu na ida ao Distrito de Uvaia: Marlene forjou um desaparecimento sem posse da documentação ou, por alguma razão, foi morta pelos ‘comparsas’?
Para o delegado, a segunda hipótese é mais contundente. “Desde o dia 17 ninguém mais teve notícias de Marlene. Ela simplesmente desapareceu e não manteve contato com mais ninguém. Logicamente, diante de todo esse cenário, tudo leva a crer que, infelizmente, ela tenha sido vítima de homicídio e que, possivelmente, o corpo tenha sido ocultado”, expõe.
O que havia dentro do cofre misterioso?
Durante as buscas na residência do casal suspeito, a Polícia Civil não encontrou o cofre roubado. O paradeiro do objeto ainda é um mistério assim como não se sabe qual o seu conteúdo.
Supostamente, há ali algo de grande valor e que, possivelmente, seja de fruto de atividade ilegal. No entanto, os policiais desconhecem o que estava guardado. “Isso não foi repassado nem pela vítima do roubo e nem pela proprietária do cofre”, disse o delegado.
Também não se sabe, mas é possível desconfiar, a razão do cofre ter ficado aos cuidados de diferentes pessoas recentemente, inclusive da própria Marlene.
Por que a vítima não fez ‘BO’ do roubo do cofre?
O roubo aconteceu no dia 17 de dezembro pela manhã. Porém, a Polícia Civil só descobriu o ocorrido no mês seguinte. Foi essa revelação obtida pelos policiais por conta própria que mudou o rumo das investigações do ‘Caso Marlene’. Os moradores da casa, que foram rendidos pelos criminosos, não registraram boletim de ocorrência em nenhum órgão. Ou seja, o roubo não existia no sistema policial.
A reportagem questionou o delegado Fernando Jasinski sobre a razão que levou as vítimas a ocultarem o crime. “Por estarem com medo, temendo pela vida. Esta foi a justificativa apresentada”, disse o delegado.
Marlene não teria sido coagida pelos suspeitos?
A Polícia Civil de Ponta Grossa não tem informações que sugiram coação por parte do casal. “Pelas investigações nós temos que ela repassou as informações aos suspeitos de forma espontânea. Não existe qualquer informação que ela tenha sido forçada a se envolver com essa situação”, diz o delegado.
Primeira versão do casal é desmontada pela investigação
O casal preso nesta quinta-feira chegou a ser ouvido pela polícia dias depois do desaparecimento de Marlene. Marido e mulher foram convocados na época por conta da empresária ter sido flagrada por vídeo entrando no carro. Além deles, os policiais ouviram inicialmente familiares da empresária e um ex-namorado.
A versão apresentada pelo casal era de que o encontro se deu para destrocar notebooks em razão de uma suposta negociação, tendo Marlene, nesta ocasião, pedido para que o casal a levasse até o ex-namorado em determinada região da cidade.
No entanto, a polícia desmontou a versão constatando que esse encontro nunca aconteceu, tendo o ex-namorado chegado em casa antes do desaparecimento. A residência, inclusive, é distante do suposto ponto de encontro alegado pelos suspeitos no depoimento inicial.
Marlene, mãe de quatro filhos, disse que ia comprar fios
Proprietária de um ateliê de costura e bordados, Marlene, de 47 anos, tinha saído de casa na tarde de 17 de dezembro dizendo que ia comprar fios para a loja. Ela morava com três dos quatro filhos. Pouco dias depois do sumiço, a filha mais velha (Brenda, 24 anos) disse ao DC que o carro no qual a mãe tinha entrado era da ex-diarista, que havia trabalhado há três meses por duas semanas na casa da família.
A ex-diarista teria falado que Marlene pediu carona por estar com a documentação do veículo atrasada. “Isso não procede. Eu tenho todos os recibos que comprovam que o veículo está em dia. E se estivesse com pendências a minha mãe nem teria ido para o Centro com ele”, contou Brenda na época.
Outra informação repassada pelos familiares dá conta de que o GPS do celular de Marlene foi desativado. “Tentamos rastrear o celular dela, mas os dados do GPS foram apagados três minutos depois que ela entrou no veículo. Tentamos ligar, mas o celular permanece desligado desde então. Já percorremos os hospitais da cidade também. E a angústia só aumenta”, disse Brenda na entrevista.
Além de Brenda, Marlene é mãe de duas crianças, de 8 e 11 anos, e uma moça de 19 anos. A empresária namorava um homem que mora em Curitiba e que esteve em Ponta Grossa em dezembro para acompanhar o caso.