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Polycarpo Borges, o homem que viveu 123 anos e morreu em PG

Cidades centenárias como Ponta Grossa reservam histórias, surpresas e mistérios em seus cemitérios. André Rosa, que participa da página do Facebook Ponta Grossa Memória Viva, criada pelo Diário dos Campos, encontrou uma dessas raridades em um dos mais antigos repousos dos que partiram, o Cemitério Municipal São José, que começou a ser utilizado em 1881.

Entre os túmulos do tropeiro curitibano que se tornou um rico fazendeiro em Ponta Grossa, o Barão de Guaraúna – ele se chamava Domingos Ferreira Pinto e morreu em 1893 – e o de Corina Antonieta Portugal, a jovem carioca que em 1889 foi assassinada pelo marido e que leva a mística de fazer milagres, está um menos famoso, porém repleto de dúvidas difíceis de sanar.

A lápide de ferro em um túmulo de pedra diz: “Aqui dorme Polycarpo R. Borges (Poly)”. Logo em seguida vêm as datas de nascimento, 5 de agosto de 1804, e de falecimento, 16 de março de 1927. Com a observação: “Com 123 annos (com dois n), 7 mezes (com z) e 20 dias de idade”. E, para aguçar ainda mais as inquietações, a frase: “Saudades de sua Espoza (com z) Claudina Borges”.

A postagem do professor de Português nascido, criado e formado em Ponta Grossa, atualmente morando em São Paulo (SP), fez sucesso, ganhou centenas de likes e comentários. Anderson Ferreira de Andrade, outro participante da página, foi fundo. Descobriu e publicou o Registro de Casamento de Polycarpo com Claudina, de número 156, lavrado por Salvador Ribeiro de Souza.

Aí surge uma pulga atrás da orelha: o casório dos então viúvos foi às 10 horas da manhã do dia 14 de março de 1896. O registro diz que Claudina tinha 30 anos e o lavrador Polycarpo 62 anos. Bem, se em 1896 ele tinha 62 anos, o ano de seu nascimento seria então 1.834, e não 1.804 como consta na lápide. Onde se grafou errado? Ou Polycarpo subfaturou sua idade para a jovem noiva?

O atestado de óbito, do dia 16 de março de 1927, reforça que Polycarpo tinha 124 anos. A causa da morte foi arterioesclerose e ocorreu às 2h35 na casa dele, na Rua Ermelino de Leão, 52. O médico JM de Paula Braga foi o atestante, Alfredo Santanna o oficial de registro e Adolpho Soares Ribas o escrivão. Nos comentários no Facebook, alguém questionou: seria ele o mais longevo do mundo?

Essa ficará sem resposta, mas considerando a placa no túmulo e a certidão de óbito, André Rosa, que tirou a foto há mais de dez anos e só a redescobriu nos seus arquivos na segunda-feira (18), observa que “Poly nasceu no tempo do Brasil Colônia – antes da chegada da Família Real, em 1808, e era um jovem quando a Independência do Brasil foi proclamada (em 1822)”.

Citando outras datas históricas, o autor da postagem que viralizou acrescenta que Poly “foi testemunha de toda a Guerra da Tríplice Aliança contra o Paraguai (1864-1870), tinha 90 anos quando acabou a Guerra de Canudos (1897) e certamente viu os soldados passarem pelas ruas de Ponta Grossa durante a Guerra do Contestado (1912-1916)”. Essa, o Diário dos Campos cobriu.

Vai ainda mais longe: “Poly foi contemporâneo da invenção da fotografia (1839), do cinema (1895), e talvez tenha ouvido as primeiras transmissões radiofônicas no Brasil (1922), por onde talvez tenha ouvido falar da Semana de Arte Moderna (1922). Deve ainda ter se espantado com o naufrágio do Titanic (1912), com a Revolução Bolchevique (1917) e a Primeira Guerra Mundial (1914-1918)”.

– E ainda deixou uma senhora viúva!

Assim André Rosa arrematou o texto, depois de enumerar vários outros acontecimentos históricos nacionais e mundiais que se enquadram no suposto período de vida de Polycarpo, que era natural de Villa Entre Rios, hoje Guaragi. “Sempre gostei de passear no Cemitério São José, pois acho que é o melhor conglomerado de patrimônios cultural e histórico de Ponta Grossa, que infelizmente está sendo vandalizado”, disse, encerrando a entrevista.

Transcrição da Certidão de óbito de Polycarpo Soares Ribas

“Aos dezesseis dias do mez de março de mil novecentos e vinte e sete, nesta cidade e comarca de Ponta Grossa, Estado do Paraná, compareceu em meo cartorio Adolpho Soares Ribas e (palavra que não se entende) do atestado do médico Dr. JM de Paula Braga declarou que hoje as duas horas e trinta e cinco minutos em domicilio nesta cidade a Rua Ermelino de Leão n.º 52, victima de arterioesclerose falleceu “POLYCARPO RIBEIRO BORGES”, com cento e vinte e quatro anos de edade, cor branca, lavrador, natural deste Estado e residente nesta cidade, filiaçao o declarante ignora; que era casado em segundas nupcias com Claudina Borges; que deixou filhos do primeiro matrimonio; que deixou testamento; que o corpo vae ser sepultado no cemitério desta cidade; E para constar, lavrei este termo que sendo lido e achado conforme conmigo assigna o declarante. Official de registro e escrivão, Alfredo Santanna/ Adolpho Soares Ribas”

Transcrição do Registro de Casamento de Polycarpo e Claudina, por Anderson R. Ferreira de Andrade

“Registro de Casamento número 156 – ” Aos quatorze dias do mês de março de um mil oitocentos e noventa e seis, às dez horas da manhã, na sala da residência do cidadão Salvador Ribeiro de Sousa, nesta Villa de Entre Rios, comarca de Ponta Grossa, Estado do Paraná, perante o segundo juíz districtal em exercício, cidadão Tibúrcio Pupo Ferreira, commigo escrivão do seu cargo abaixo nomeado e as testemunhas Capitão Jacintho Gomes d’ Oliveira e Estevão Ribeiro d’ Almeida, receberam se em matrimônio Pulycarpo Ribeiro Borges, filho de Francisca Borges, já fallecida e pai incógnito com sessenta e does annos de idade viúvo, lavrador natural e residente neste districto, Claudina Maria de Sousa, filha de Isabel Maria do Espírito Santo, pai incógnito com trinta annos de idade, viúva natural de Campo Largo, e residente neste districto; os quaes no mesmo acto declaram-se que não tem parentesco entre si em gráo prohibido e nem tem qualquer impidimento legal conhecido que os inhiba de casar-se um com outro. Declaram mais que o contrahente de seu primeiro matrimônio tem os seguintes filhos – Anna, de trinta e cinco anos de idade mais ou menos, Antônio com trinta e does annos mais ou menos, casado, Ildifonso com trinta annos de idade mais ou menos casado e que a contrahente não tem filhos algum, Do que para constar lavro o presente termo, que todos assignam, assignando mais os cidadãos Alexandre Antônio Antunes, Apollinario Cândido dos Santos, a rogo dos contrahentes por não saberem ler nem escrever. Eu Salvador Ribeiro de Sousa escrivão que escrevi: Tibúrcio Pupo Ferreira, Alexandre Antônio Antunes, Apollinario Cândido dos Santos, Jacintho Gomes de Oliveira com cincoenta e oito anos de idade, negociante e morador neste districto, Estevão Ribeiro de Almeida com trinta e sete annos de idade, negociante e morador n’esta Villa. Salvador Ribeiro de Souza”

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