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Serviço público e cultura em dias de férias

Rafael Schoenherr*

Quem procura uma biblioteca pública no período de férias escolares em geral se decepciona. O horário de atendimento costuma ser reduzido justamente quando, em tese, os leitores teriam mais tempo a dedicar aos livros. As administrações estão longe de orquestrar, ao que parece, os limites estruturais do quadro de funcionários ao fato de que as bibliotecas hoje agregam serviços variados e demandas relevantes. São lugares de empréstimo, leitura, acesso a periódicos e internet.
Uma indicação a se pensar é o ritmo da cultura, a solicitar expedientes específicos. Uma comparação pode ajudar. Recentemente um telejornal tentou responder oportuna dúvida de moradora sobre como alguém poderia visitar pontos turísticos da cidade usando exclusivamente o transporte coletivo. A reportagem assinalou a dificuldade e descobriu um projeto de incentivo a passeios pelo município. No entanto, a iniciativa estava ‘de férias’.
Da mesma forma, soa curioso a quem caminha no fim de tarde ou à noite jamais encontrar no trajeto uma biblioteca aberta. Se é ruim nos centros, fica ainda pior nos bairros. As informações do mercado editorial brasileiro e os resultados do Plano Nacional do Livro sugerem ampliação recente do universo leitor no país. Seria uma chance razoável para o planejamento de novas bibliotecas incluir essa preocupação de ampliar serviços e estender o atendimento. Tem a ver com a estrutura física e a localização no espaço urbano, mas também com a contratação de funcionários e criação de vínculos com a comunidade.
O expediente da cultura deveria comportar outras lógicas para além do ponto de vista estritamente administrativo na gestão pública. Caso contrário, a agenda cultural municipal esvazia, os teatros fecham e os shows ficam raros em janeiro e fevereiro. Na maior parte dos casos, não se trata, vale lembrar, de um amplo conjunto de atividades culturais espalhadas pela cidade que cessa nas férias, mas da interrupção das poucas, únicas e restritas opções culturais centralizadas imprescindíveis ao funcionamento da vida cultural e da programação de lazer.
Esse aspecto se desdobra em pelo menos dois problemas. Em primeiro lugar, denuncia a falta de planejamento para oferta de opções culturais mesmo em período de férias do quadro administrativo. Se a agenda normal sofre interrupção, poderia existir uma programação alternativa, previamente estruturada, condizente com o período. Caso contrário, vicia-se o comportamento social cada vez mais em torno de opções pouco plausíveis como litoral e balneários. Seria diferente se as cidades não dependessem tanto da agenda cultural oficial, com outras ofertas e ações.
Um segundo problema é que, temporariamente, a administração pública ‘se permite’ restringir ainda mais, durante as férias escolares, o acesso dos cidadãos a opções na programação. Torna-se discutível aí o amplo direito constitucional à cultura se ações são interrompidas no período – como se o tratamento à cultura fosse tão sazonal quanto o pagamento do IPTU. Mais previsível que isso só o fato de que janeiro sempre chega.

* jornalista, membro do Conselho Municipal de Cultura de Ponta Grossa. A versão completa do artigo está em http://prensado.wordpress.com

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