Nos primeiros tempos de afirmação do regime republicano, a guerra civil entre federalistas e florianistas foi o evento que deixou as mais profundas marcas nos estados sulinos. Prolongando-se por quase três anos (1893/1895), as mortes ocorridas, de lado a lado, somaram mais de quinze mil. Como acontece em embates que envolvem pessoas da mesma pátria, o grau de barbarismo e violência foi muitas vezes maior dos que ocorrem em conflitos externos.
Os degolamentos sumários
Não obstante esses morticínios, a guerra foi ponteada por alguns fatos que merecem análise e correção. Um deles, diz respeito aos degolamentos sumários a que foram submetidas as partes contendoras, principalmente no Rio Grande do Sul. Tanto maragatos (federalistas) quanto pica-paus (forças oficiais) lançaram mãos desse método medievalesco de extermínio dos opositores.
Tipos de degola
Havia até modalidades diferentes desse suplício, como asseverou um desses gaúchos da fronteira: hay dos maneras de degolar um cristiano – a la brasileira (dois talhinhos seccionando as carótidas) o a la criolla (de orelha a orelha). À margem desse sistema selvagem, surgiram diversas histórias, algumas, folclóricas e outras, baseadas em mera propaganda, quando se pinta o adversário com as tintas da atrocidade. Dentre as primeiras, há aquela ligada a mercenários castelhanos que eram presos – na dúvida, o degolador os mandava falar pauzinho, pão ou a letra J. Se a pronúncia denunciasse a origem espanhola do suplicante, o carrasco ia em frente…
Maragatos X legalistas
A decapitação no Paraná era sempre atribuída aos maragatos, embora existam registros de que os legalistas também recorriam a essa modalidade. Correu as redações da imprensa nacional, uma foto tirada em Ponta Grossa, quando os rebeldes aqui se encontravam acampados, que mostra uma cena supostamente explícita de degola de um preso florianista. Era a melhor propaganda contra os revolucionários ou então cortina de fumaça para os muitos fuzilamentos encetados pelos sedizentes legalistas.

Um cenário teatral
Mas a tal foto, tirada no mês de abril de 1894, foi na verdade uma encenação, um quadro teatral para mostrar como é que procedia o cabo Sebastião Juvêncio, degolador oficial da coluna pica-pau do senador Pinheiro Machado, então preso pelos maragatos.
É preciso lembrar que, nesta cidade, embora a maioria da população apoiasse os revoltosos, não houve qualquer execução, seja por degola ou fuzilamento, contrariamente ao que vem anotado no rodapé da tal foto. Nela, percebe-se claramente que os retratados fazem calculada pose com suas espadas e armas de fogo e que o carrasco, segurando um facão no pescoço do supliciado que se encontra de joelhos, também olha diretamente para a câmera.
Coisas da guerra!
O autor da coluna Memória Viva é um dos fundadores da Academia de Letras dos Campos Gerais, advogado, e foi juiz, vereador e prefeito da cidade de Prudentópolis, de onde é natural. Entusiasta da História, é autor de diversos livros, incluindo “Das Colinas do Pitangui…” e “Corina Portugal: História de Sangue e Luz”.
