Embora a vigência do Código Civil Brasileiro remonte a janeiro de 2003, muitas novidades ali trabalhadas ainda merecem destaque pelo inusitado de seus vértices e, essencialmente, pela manifesta preocupação do legislador em assegurar o equilíbrio das relações disciplinadas pelo Direito.
Sob tal perspectiva, oportuno se faz grafar que no respeitante aos contratos em geral (artigos 421 e seguintes), a homenagem aos caminhos da probidade e da boa-fé objetivando priorizar a função social das contratações , desembocou em interessantes construções.
Uma delas é justamente o contrato com pessoa a declarar previsto na Seção IX, inaugurada pelo artigo 467:
No momento da conclusão do contrato, pode uma das partes reservar-se a faculdade de indicar a pessoa que deve adquirir os direitos e assumir as obrigações dele decorrentes.
Tal disposição, que não encontra qualquer correspondência legislativa anterior, pode a priori causar a impressão de que se estaria oficializando a figura do laranja, cuja expressão, na acepção de gíria, ganha a definição daquele agente intermediário (popularizado especialmente no mercado financeiro) que promove, a mando de terceiro, transações que ocultam a identidade do verdadeiro comprador ou vendedor.
No entanto, a leitura dos demais artigos que compõem a seção identificada, aliada ao exame do contexto legislativo em que a mesma está inserida, revelam que a intenção do Código não admite a recepção de qualquer conotação fraudulenta ou irregular:
Art. 468. Essa indicação deve ser comunicada à outra parte no prazo de cinco dias da conclusão do contrato, se outro não tiver sido estipulado.
Parágrafo único. A aceitação da pessoa nomeada não será eficaz se não se revestir da mesma forma que as partes usaram para o contrato.
Art. 469. A pessoa, nomeada de conformidade com os artigos antecedentes, adquire os direitos e assume as obrigações decorrentes do contrato, a partir do momento em que este foi celebrado.
Art. 470. O contrato será eficaz somente entre os contratantes originários:
I – se não houver indicação de pessoa, ou se o nomeado se recusar a aceitá-la;
II – se a pessoa nomeada era insolvente, e a outra pessoa o desconhecia no momento da indicação.
Art. 471. Se a pessoa a nomear era incapaz ou insolvente no momento da nomeação, o contrato produzirá seus efeitos entre os contratantes originários.
De fato, o que se percebe é que a projeção de tal faculdade, longe de priorizar relações contratuais escusas, busca primar pela equivalência dos direitos e obrigações, afastando assim eventual possibilidade de atuação desleal ou oportunista relacionada à figura pessoal ou empresarial de uma das partes.
Exemplo disso é a possibilidade do desequilíbrio causado por possível supervalorização ou superfaturamento dos bens envolvidos numa contratação quando o interessado for pessoa de notória capacidade financeira.
Imaginada esta hipotética situação, plenamente justificada resta a previsão contratual aqui destacada.
Continua na próxima semana.
Carlos Roberto Tavarnaro
– OAB/PR 5.132