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Vamos dar a preferência à vida

Arcelio Benetoli

Como são interessantes as diferenças entre as nações. Quando nos referimos ao trânsito, ou melhor, à movimentação de pessoas dentro da cidade seja a pé, de bicicleta ou de carro, encontramos extremos entre países. Na Alemanha, por exemplo, quando o pedestre coloca o pé na faixa os carros param imediatamente. Não importa se o sinal esteja aberto ou fechado. A preferência sempre é da pessoa, do ser humano, da vida. Qualquer brasileiro que chegue a Munique ou Berlim em seu primeiro contato internacional se espanta com a forma como aquela sociedade transita dentro da cidade. Há ciclovias, há calçadas “andáveis”, há sinalização (para motoristas, ciclistas e pedestres) e todos seguem as normas estabelecidas pela própria sociedade.

Quando me mudei para Ponta Grossa há um ano e meio, apesar de ter sido muito bem recebido, confesso que esperava um comportamento no trânsito um tanto quanto diferenciado, justamente por saber que parcela considerável dos habitantes tem ascendência alemã. Ledo engano. Já de cara, doei minha bicicleta pela impossibilidade de usá-la no trânsito da cidade, sei que o relevo não colabora também, mas o total descaso com este meio de transporte é patente.

Decidi então fazer caminhadas ao entardecer, mas em função de poucos espaços públicos adequados para tal e de tanto pisar nas fezes caninas, parei também. Agora faço caminhada numa esteira na academia bem recluso, longe do ambiente aberto, da brisa e da vida da cidade ao redor.

Infelizmente, disponho agora de mais um motivo para não sair à rua: o perigo de ser atingido por automóveis que invadem a calçada em alta velocidade. Fiquei chocado com o terrível fato que aconteceu esta semana. Uma jovem professora de balé clássico, fazendo caminhada praticamente no centro da cidade foi morta por um carro em alta velocidade. Até onde sei, não culpo o motorista pelo acontecido, visto que ele é fruto de nossa sociedade “carrocêntrica”, que valoriza mais o carro que a vida.

Em minha opinião, quem matou esta jovem de 28 anos, não foi o rapaz de 24, fomos nós. Foi a sociedade brasileira, permissiva com e indulgente comportamentos inadequados ao volante. Fatos semelhantes estão em todas as manchetes de jornal Brasil a fora. Parafraseando o Detran, creio que chegou a hora de darmos preferência para a vida! Eu já estava chocado com a questão do trânsito no Brasil quando ouvi da boca do ministro da saúde, na abertura da X Conferência Estadual de Saúde em Curitiba, que o SUS precisa estimular as residências para formar mais neurocirurgiões, pois os acidentes de trânsito estão aumentando. Eu me pergunto se este é o caminho que queremos trilhar. Podemos ficar tranquilos que quando acontecer um corriqueiro acidente de trânsito conosco teremos bons neurocirurgiões para nos socorrer? Não retiro de forma alguma a importância das medidas curativas, mas não seria mais profícua a prevenção, que, aliás, é um dos princípios do nosso sistema de saúde?

Por que não encetamos campanhas de educação no trânsito? Por que não valorizamos o transporte coletivo e formas alternativas de locomoção? Por que não desaceleramos quando o sinal está para fechar ou ficar amarelo ao invés de acelerar? Por que não paramos na faixa? Por que não valorizamos o pedestre? Por que não valorizamos a vida acima de tudo, principalmente quando se trata de uma tonelada de metal em velocidade contra frágeis 70 kg de carne, osso, sentimento e sonhos?

Estou triste com nossa falta de mobilização social. Parece que ninguém quer fazer nada para modificar a questão do trânsito em nossa cidade. Será que deixaremos este fato passar em branco? Está bom do jeito que está pra você? Será que só nos sensibilizaremos quando acontecer algo semelhante com nossos entes queridos? Espero que todos possamos buscar medidas corretivas, através da ativa participação da sociedade civil, a fim de que fatos nefastos e evitáveis como esse nunca se repitam em nossa cidade.

O autor é professor da UEPG – arceliobenetoli@hotmail.com 

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