em

Licenciatura e formação de professores: quando o lugar prejudica a visão dos fatos (parte I)

 

 

Norberto Eliaquim

 

No seu livro ‘A Visão em Paralaxe’ o filosofo Slavoj Zizek demonstrou a dificuldade da conciliação de dois pontos de vista diferentes sobre o mesmo assunto. Um texto, nesse espaço, discorreu sobre a questão das licenciaturas e da formação de professores, mas ao que parece, o ponto de vista do autor não lhe permitiu tocar nas causas reais dos problemas enfrentados pela formação profissional daqueles que estão à frente das salas de aula nesse país.

Há alguns anos li, não me lembro onde, os resultados de uma pesquisa que relatava o fato de a maioria dos professores terem sido criados em casas sem livros. Absolutamente real, pensei na época. Desempenho essa profissão e meus pais, portadores de instrução primária, não me deram hábito da leitura que tive de adquirir depois mal e parcamente, a ferro e fogo, por conta de meu curso de graduação, uma licenciatura. Mas onde estavam meus contemporâneos com o raro hábito da leitura, nesse país, e com livros em casa enquanto cursava minha faculdade? Provavelmente num curso de Medicina ou Direito.

A escola pública da primeira metade do século XX e de parte da segunda metade não ensinava bem por os livros da época serem melhores que os de hoje, que aliás alguns são ótimos. É pelo fato de que atendia pouca gente, pessoas de classe média ou mesmos das classes mais baixas que queriam que seus filhos estudassem. Uma época de ouro, segundo alguns colegas de profissão mais próximos da aposentadoria, pois os professores eram respeitados.

Com a massificação do ensino, a inclusão nas escolas de pessoas que não estão preparadas para o convívio em um ambiente que lhes exige o que nunca lhes foi dado, a escola pública degringolou. As elites brasileiras sempre foram extremamente burras e nunca pensaram que os pobres também faziam parte da nação. Esses, por sua vez mimetizaram aversão ao conhecimento e à cultura e passaram a mandar seus filhos para a escola à contragosto.

Entre 1964 e 1985 tivemos a praga da Ditadura Militar que empurrou goela à baixo da Universidade uma reforma que a deixou com seus cursos parecidos com uma continuação do Ensino Médio, criou as licenciaturas curtas, proporcionando formação curta, para professores com salário curto exercer uma semi-profissão. Herdamos desse período uma série de vícios que talvez nem consigamos corrigir. Um dos principais pode ser o de termos feito do magistério uma profissão indigna, desonrosa e incapaz de atrair os alunos mais talentosos.

O apoio do Estado às escolas particulares, que outrora não eram consideradas escolas de verdade, tornou nossa educação pública falida. O país precisa de engenheiros, mas alguns alunos meus do Ensino Médio não vão ser bons frentistas, nada contra os simpáticos rapazes que abastecem meu carro velho motor 1.0. Minha geração aprendeu muito pouco na Universidade não apenas pelo fato de a academia ter problemas que ainda não conseguiu corrigir.

 

O autor é professor de história e funcionário da UEPG

 

Participe do grupo e receba as principais notícias da sua região na palma da sua mão.

Entre no grupo Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.