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Do roubo na farmácia à farmacopeia

Renato Pereira*

 

Assistiu-se atônito ao resultado de um roubo na farmácia, semana passada. Três jovens, dois menores. Um deles, de 14 anos, morto. Fórmulas, preceitos, mídia e uma série de especuladores políticos e sociais trazendo suas opiniões a respeito do assunto.

Segundo o Mapa da Violência, publicado em 2013, entre 1980 e 2010, quase 800 mil cidadãos morreram por disparos de algum tipo de arma de fogo. Entre os jovens de 15 a 29 anos, houve um crescimento de mais de 400% nesses 30 anos.

Entretanto, é possível dizer que Ponta Grossa, uma cidade de médio porte, que segundo dados oficiais recentes, conta com quase 350 mil habitantes, mais provinciana e menos cosmopolita, os elementos que resultam em medo e tensão, gerados por configurações específicas do urbano, ainda são resultados de atos isolados. Uma atividade saudável e até mesmo didática é se questionar se quem surgiu primeiro foi o medo ou o ‘outro’; que vive, comunica, aparece e desaparece.

De acordo com Bauman, diferente dos animais em geral e além do medo inato, o ser humano vivencia um medo histórico, social e culturalmente reciclado, associado às sensações de insegurança e vulnerabilidade. Já em uma obra denominada Fobópole o autor aponta que o medo é fator condicionante e estruturante das relações sociais. Que outro momento histórico reúne condições necessárias tão propícias para o afloramento desse sentimento?

Ao refletir sobre o assunto, pode-se dizer que se vive um momento de plus juvenil, onde, erroneamente, o ator principal não é o menino usuário de droga que externaliza em violência sua prática cotidiana e sim o Estado, que, por meio de entes políticos, corrompe a família, dilata a escola, demoniza o professor e é sucumbido pelo jogo político.

Esse jogo de faz-de-conta, percebido nas diversas práticas cotidianas têm configurado a vida social urbana, não sendo os dois lados, mas as diversas arestas dessa mesma moeda. Basta dizer que, na Idade Média, raspar ouro das arestas das moedas era prática comum para se produzir mais moedas, depreciando seu valor monetário, e que, no setor privado, constituía crime cuja punição era a morte.

O dado assustador que se visualiza é que o monstro da violência alimenta o monstro da mídia, que alimenta o monstro do partido político, que alimenta a canalhice, a roubalheira, o astuto, o político, que alimenta o povo com [a]tos, [b]olsas e [c]otas e que produz o a-b-c do conhecimento fajuto, eis o novo folclore brasileiro. Afinal, para que valorizar a educação e a cultura? Ora, quando se reproduz uma pedagogia que pretende uniformizar, colonizar e administrar, o resultado é a seleção de sujeitos.

O que se consegue perceber além da sombra projetada? Cogito, ergo sum, disse René Descartes. Eu sou corpo e alma – assim balbucia a criança. E por que não se deveria falar como as crianças?, sussurraria Zaratustra. Porque haveria de se contentar com a parcialidade ou preferência por alguma dessas falas nesse teatro de faz-de-conta político? Afinal, é possível construir novas ideias sem a existência de meias verdades?

 

*O autor é mestrando em Geografia. Associado do Instituto Trilobita de Desenvolvimento, Educação, Cultura e Pesquisa

 

 

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